Além do voto: a participação política como forma de superar o desgaste eleitoral
Por Augusto Patrini
Iniciada em 2013, a crise política no Brasil se aprofundou nos últimos anos, com impeachment da presidente Dilma Rousseff, em 2016, a crescente impopularidade dos políticos tradicionais e a intensa polarização que marcou as eleições de 2018, com discursos de ameaça à democracia. O acúmulo dessas experiências traumáticas parece ter deixado ao menos parte da sociedade desalentada politicamente. Mas o voto é uma das possibilidades de engajamento político do cidadão, não a única. O que pode ser feito agora?
Primeiro, há de se entender o contexto. Para Alexandre A. Loch, psiquiatra pesquisador do Hospital das Clínicas de São Paulo (USP), vários fatores conspiram para o atual sentimento de desesperança. “Temos uma sociedade paternalista desde seu nascimento. Essa característica se frustrou com um ex-presidente que proveu aos mais pobres e agora está atrás das grades, acusado de comandar um esquema de aproveitamento ilícito do dinheiro público.” Além disso, prossegue Loch, a Operação Lava-Jato expôs uma corrupção sistêmica que rompe com os limites de partidos e instituições. E tudo isso ocorre num cenário de instabilidade econômica e desemprego.
Luiz Carlos Ribeiro, professor de História do Brasil e História Contemporânea da Universidade Federal do Paraná, observa, em vez de desalento, um clima de efervescência: “O que ocorre são novas formas de participação política, como vimos nos movimentos de rua, desde 2013 até o mais recente #elenão, além da atuação nas redes sociais e da derrota de partidos tradicionais.” De todo modo, seja via desalento ou fúria, há um perceptível desgaste em certos setores da população, com a proliferação de notícias sobre brigas e ataques de motivação política no último período eleitoral.
Talvez, portanto, seja um bom momento para lembrar que a atuação política do cidadão não se resume às eleições. A sociedade civil pode participar da política fiscalizando a administração pública, ao recorrer, por exemplo, a mecanismos como os previstos na Lei 12.527/2011, mas também ao participar de conselhos e outros órgãos consultivos.
O Decreto de Lei 8.243, de maio de 2014, estabeleceu no Brasil o programa de Política Nacional de Participação Social (PNPS) e o Sistema Nacional de Participação Social (SNPS), com o objetivo de garantir a aproximação da sociedade civil das decisões sobre políticas públicas. Os conselhos municipais, por sua vez, garantem ao cidadão uma participação ativa no processo de criação dessas políticas.
A Agenda Pública trabalha para promover serviços públicos de qualidade nas cinco regiões do país como forma de assegurar direitos fundamentais a todas as pessoas. Para isso, a organização articula representantes da sociedade civil com governos locais e empresas. Nesse contexto, o coordenador de projetos Gilson Lima, que atua em Canaã dos Carajás, no Pará, enxerga muitas formas de o cidadão atuar politicamente, para além do voto e da adesão a partidos, o que renova suas esperanças.
“Há de emergir uma nova ordem, capaz de propiciar igualdade, fraternidade e liberdade. Somente nesse equilíbrio dinâmico é possível emergir uma verdadeira democracia.” Para Gilson, independentemente de preferências político-partidárias ou religiosas, é hora, mais do que nunca, de trabalhar pela democracia e pelo respeito ao semelhante.
Fonte: Agenda Pública